O aumento das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), fixado pelo governo federal na semana passada por meio de decretos, tem provocado fortes reações no Congresso. Nessa quarta-feira (28) à noite, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, reuniram-se com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e líderes das duas Casas para tratar da insatisfação do Parlamento com o ato do Executivo.
O deputado Hugo Motta expressou nas suas redes sociais, nesta quinta-feira (29), que “o clima é para derrubada do decreto do IOF na Câmara”.
— Combinamos que a equipe econômica tem dez dias para apresentar um plano alternativo ao aumento do IOF. Algo que seja duradouro, consistente e que evite as gambiarras tributárias só para aumentar a arrecadação, prejudicando o país — disse Motta.
Em Plenário, na quarta-feira, Davi Alcolumbre também criticou o governo pelo aumento do imposto sem uma consulta prévia ao Parlamento. Para o presidente do Senado, esse exemplo do IOF deve ser “a última daquelas decisões tomadas pelo governo tentando de certo modo usurpar as atribuições legislativas do Poder Legislativo”.
— Cada Poder tem as suas atribuições, tem as suas competências. Nós não vamos aceitar que um Poder possa interferir em outro Poder, e esse caso concreto levantou toda essa polêmica. Poderiam ter buscado o diálogo, a conciliação, a pacificação e o entendimento. Fizeram e tomaram uma decisão unilateral, que dá o direito ao Parlamento tomar uma decisão unilateral de colocar em votação o projeto de decreto legislativo.
Nas duas Casas Legislativas, senadores e deputados já apresentaram projetos de decretos legislativos para derrubar os decretos presidenciais (12.466 e 12.467). Na Câmara, já são quase 20 os PDLs protocolados contra a elevação do IOF. No Senado, são dois.
A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou terça-feira (27) requerimento ( REQ 47/2025 - CAE ) do senador Izalci Lucas (PL-DF) para que o ministro Haddad preste explicações sobre a elevação do imposto. O parlamentar reiterou que o IOF é um imposto regulatório e não arrecadadório.
— Os impostos arrecadatórios precisam obedecer a legislação, o princípio da anualidade — não pode criar o imposto no mesmo ano — e aí já temos uma inconstitucionalidade. Há um aumento absurdo. Já apresentamos PDL para suspender isso e estamos preparando já uma Ação [Direta] de Inconstitucionalidade (ADI), porque o imposto é inconstitucional — disse Izalci.
De acordo com a Secretaria-Geral da Mesa do Senado, nos últimos 25 anos não houve a derrubada de qualquer decreto presidencial por parte do Congresso. Alguns PDLs chegam a ser aprovados em uma das Casas, mas antes que passe por votação na outra, o governo de plantão recua com a decisão imposta pela norma administrativa.
Foi o que aconteceu, por exemplo, em 2023, quando o governo federal publicou dois decretos que modificavam o marco legal do saneamento básico. Com a derrubada desses instrumentos na Câmara, o Executivo voltou atrás para que o mesmo não ocorresse no Senado.
O decreto presidencial publicado eleva as alíquotas do IOF para operações de crédito (empréstimos e financiamentos), gastos no exterior (compras com cartão de crédito e pré-pagos internacionais e moeda estrangeira em espécie) e investimentos em previdência privada. Com as reações à medida, o governo já recuou em parte, como na previsão de alta do tributo para os investimentos no exterior. A elevação do IOF tem o propósito, segundo o governo, de ajudar no alcance da meta de superávit primário de 0,25% do produto interno bruto (PIB) em 2026.
Segundo o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Marcus Penha, o governo, diante das dificuldades para cumprimento das metas, optou por um aumento de um imposto de características regulatórias, o que causa “enorme resistência” na sociedade. Para o economista, cabe ao Congresso Nacional e ao governo construírem alternativas para a superação da crise fiscal.
— A IFI tem alertado desde 2024 para a trajetória insustentável das finanças públicas com o engessamento crescente do Orçamento, alta contínua do endividamento público e compressão absoluta da margem discricionária de despesas. A situação é extremamente delicada em 2025, se agravará em 2026 e chegará ao estrangulamento absoluto em 2027, caso mantidas as atuais regras de nosso regime fiscal. Há que se produzir uma profunda reforma em várias frentes. A carga tributária de 32,3% do PIB já é líder entre os países emergentes — expôs Penha.
Consultor legislativo do Senado na área de orçamento, Sergio Machado explica que o aumento do IOF afeta a vida do brasileiro comum, já que os custos financeiros do setor produtivo tendem a ser repassados ao consumidor final, como forma de preservar a margem de lucro e a viabilidade econômica das empresas.
— Um exemplo recente foi a chamada 'taxação das blusinhas', em que a elevação de tributos sobre plataformas de comércio internacional acabou gerando aumento de preços ao consumidor. O mesmo raciocínio se aplica aqui: o setor produtivo, ao enfrentar custos maiores, ajusta seus preços, e o impacto recai, em última instância, sobre a população — expôs Machado.
Para o consultor, a reversão do decreto dependerá do grau de disposição de Executivo e do Legislativo em ceder na redução das despesas discricionárias que, embora muitas vezes tratadas como se fossem “de cada Poder”, na verdade pertencem à administração pública como um todo e, em última instância, à sociedade brasileira.
— Mas vale lembrar que a palavra final tende a ser do Legislativo. Afinal, 'todo o poder emana do povo', como estabelece o parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal, de forma que o Congresso tem força para alterar as regras do IOF — ou até extingui-lo — por meio de emenda constitucional, processo que prescinde da participação do Executivo — completou.
O setor produtivo é um dos que pressiona para a reversão do aumento do imposto. Segundo o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), que apresentou o PDL 240/2025 para sustar dois decretos do Poder Executivo que tratam da questão do IOF, ele tem sido bastante procurado por conta da medida presidencial.
— Eu acho que tudo, quando se faz com diálogo, não tem prejuízo algum. Mas nesse caso aqui, nós temos alguns absurdos que foram cometidos — disse Vanderlan. Ele exemplificou o caso do aumento do IOF das empresas do Simples Nacional de 0,88% para quase 2%.
Também já protocolou projeto ( PDL 223/2025 ) o senador Rogerio Marinho (PL-RN). Em pronunciamento em Plenário, o líder da Oposição afirmou que a medida penaliza quem busca crédito e traz insegurança para a economia.
— O governo apresenta, no momento em que a taxa Selic está em 14,75%, uma nova fonte de receitas, o imposto regulatório, que o governo anterior já havia decidido que seria zerado até 2028, para estarmos na mesma condição que outros países do mundo, que têm as suas finanças e a sua condição econômica equânime com as condições internacionais. O governo apresenta uma majoração de até 300% no custo da alocação de recursos através do IOF, penalizando a obtenção de créditos, dando um choque de imprevisibilidade, de insegurança jurídica e de inflação na veia, porque esses custos serão repassados aos serviços e aos produtos adquiridos pela população brasileira que venham do exterior — afirmou.
Vários outros parlamentares já ocuparam a tribuna do Senado para se manifestar a respeito do decreto presidencial. Para o senador Esperidião Amin (PP-SC), o IOF deve regular operações financeiras, e não servir como fonte de receita.
— O IOF não é um imposto destinado à arrecadação. Ele é destinado a regular as operações no sistema financeiro. A receita pública não deve depender dele para preencher buracos na situação financeira. Se a saúde financeira do país passa a exigir que o IOF seja um complemento de receita, é porque a saúde já foi embora — disse.
Já o senador Oriovisto Guimarães (PSDB-PR) declarou que o governo federal deturpou a finalidade do imposto, que deveria ser utilizado exclusivamente para regular o mercado financeiro. Ele também afirmou que o rito constitucional exigido para alterações em tributos arrecadatórios foi desconsiderado.
— Não é a vontade do Executivo que diz simplesmente: 'Vou aumentar os impostos'. Não. Para aumentar os impostos, ele tem de fazer um ato e mandar para o Congresso; o Congresso tem de analisar, tem de aprovar. E tem também o princípio da anterioridade, que visa dar segurança jurídica às empresas, a todo mundo que fez planos, que contava com uma carga de impostos. Os impostos arrecadatórios não podem ser mudados do dia para a noite — afirmou.
Na mesma linha, o senador Jorge Seif (PL-SC) criticou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, por insistir na elevação do tributo em meio a uma economia com juros altos, câmbio elevado e fuga de investidores.
— Precisamos defender o cidadão, o empreendedor, o trabalhador, e não o insaciável apetite deste desgoverno perdulário, irresponsável, que só sabe gastar, e gastar mal, o dinheiro público. O IOF é mais do que um imposto; é um impeditivo ao desenvolvimento econômico, é um impeditivo aos empregos, é encarecedor de oportunidades, é uma barreira contra a liberdade econômica. E, por fim, mas não menos importante, o IOF é uma barreira à justiça social para um povo já tão judiado por altas cargas de tributos — disse Seif.
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